O que Nietzsche defendia? O retorno à filosofia de combate – O Anticristo

Para superar o cristianismo, Nietzsche propõe uma filosofia de guerra. Clique e entenda!

NietzscheFriedrich Nietzsche defende que uma moral forte – a moral do senhor – é a que afirma a vida: o instinto que segue os desejos e busca dar livre fluxo à vontade de potência; já a moral do escravo – o cristianismo – nasce e para castrar os instintos e – de forma reativa – dominar o senhor e sua vontade de potência.

Para o autor, a “paz preguiçosa” da tolerância, do perdão e do coração largo são formas que o cristianismo encontrou para frear a vontade dos fortes, que exerciam seu domínio sobre os fracos; segundo Nietzsche, é uma moral antinatural porque não permite dar vazão aos sentidos naturais do Homem, uma vez que nega a vida que temos – a terrena – em nome de uma “vida plena” no Céu. Nietzsche defende uma filosofia que não contraria os instintos naturais, a necessidade de expansão.

Utilizando-se da “compaixão” e da abnegação, controla a elevação do poder do forte – e, em contrapartida, alimenta a fraqueza: “o cristianismo é a compaixão ativa por todos os malogrados e fracos” [1]. Através da elevação de valores doentes, invertendo a lógica natural do mundo, tolhe a vontade dos fortes.

Porém, se para Nietzsche a felicidade é a sensação de que uma resistência foi superada [2], a religião para os fortes se torna mais uma oportunidade de superar a moral cristã, os vícios que ecoam na Modernidade, e propor uma moral que não tolhe os sentidos – permitindo que os fracos sucumbam e que sua vontade seja feita valer.

Assim, se para o autor a felicidade é o acúmulo da sensação de poder, a luta contra os valores cristãos é um convite ao combate: “Não o contentamento, porém mais poder; acima de tudo não a paz, mas a guerra; não a virtude, mas a excelência (virtude no estilo da Renascença, virtú, virtude sem moralina).” [3].

Ansiar por relâmpagos e atos, colocar-se acima das discussões do seu tempo, perguntar-se pelas verdades mudas, por aquilo que ainda não se teve coragem de questionar, por aquilo que vai contra as verdades estabelecidas: questionar as verdades do nosso tempo passa, justamente, por superar as verdades do cristianismo e construir uma nova.

Para os fortes, para os independentes, preparados e predestinados a dominar, nos quais se personificam o intelecto e a arte de uma raça dominante, a religião é um meio a mais para suprimir os obstáculos, para poder reinar: é um vínculo que conjuga dominadores e súditos, que revela e presentifica aos dominadores a consciência dos súditos, naquilo que esta tem de mais abscôndito, mais íntimo, aquilo precisamente desejaria escapar à obediência. [4]

Nietzsche não está se referindo a um embate físico até a morte – resumi-lo a uma paródia barata de darwinismo seria vulgarizar (e não compreender) a sua teoria:

O problema que com isso coloco não se refere ao que deve substituir a humanidade na sucessão dos seres (o homem é um final), mas ao tipo de homem que se deve cultivar, se deve querer como sendo o de mais alto valor, mais digno de vida, mais seguro do futuro. [5] 

Nietzsche se refere a valores: o caos e o heroísmo da batalha homérica trava-se na busca por um novo tipo de homem – o super-homem – oposto ao escravo – cristão – que fora cultivado por medo daquele.

Não se deve adornar e enfeitar o cristianismo: ele travou uma guerra de morte contra esse tipo superior de homem, ele prescreveu todos os instintos fundamentais desse tipo, ele destilou o mal, o homem mau, a partir desses instintos – o homem forte como o que há de tipicamente reprovável, o “réprobo”. [6]

Nietzsche está em busca de uma filosofia de combate. Nietzsche defende uma filosofia do combate.

Referências

[1] NIETZSCHE, Friedrich. O Anticristo: maldição contra o cristianismo. Porto Alegre: L&PM, 2012.

[2] NIETZSCHE, Friedrich. O Anticristo: maldição contra o cristianismo… p.14.

[3] NIETZSCHE, Friedrich. O Anticristo: maldição contra o cristianismo… p.14.

[4] NIETZSCHE, Friedrich. Além do Bem e do Mal: Prelúdio de uma filosofia do futuro. São Paulo: Hemus, 2001. p.71-71.

[5] NIETZSCHE, Friedrich. O Anticristo: maldição contra o cristianismo… p.15.

[6] NIETZSCHE, Friedrich. O Anticristo: maldição contra o cristianismo… p.17.

5 Comentários

  1. Excelente artigo! Desnuda Nietzche em sua “dicotomia” de Deus vivo / Deus morto!!! Essa linha editorial tem a grande virtude de colocar a filosofia e seus pensadores ao alcance dos míseros mortais que, por ousadia, eventualmente tentam expressar-se na forma e tradução de seus parcos conhecimentos, diante dos estudiosos e doutos no assunto. Conforta o fato de alguém, em boa hora, ter cunhado a frase: “de louco e filósofo, todos nós temos um pouco”!!! Realmente, “embarcar” nessas ideias de Nietzche é negar a intimidade imbricada do ser humano com a natureza das coisas ou, se quiser assim considerar, com a “ordem natural das coisas”. Para ele a questão dos iguais versus desiguais resume-se/limita-se à dicotomia do forte e do fraco e da prevalência do forte sobre o fraco, considerando “in extremis” que esse último nem deveria ter surgido na vida, tal é sua incompetência e “natural” exiguidade. De extensão em extensão, de sua “moral do mais forte” ou da “filosofia do combate” deve-se presumir que a criança já deveria nascer adulta podendo dinamizar sua fortaleza e o idoso/deficiente/etc. é algo que só existe para “deleite”/”mimetismo”/ilusionismo do cristianismo e seus imbecis adeptos e seguidores, incapazes de perceber o que significa ser forte e/ou muito menos discernir e dissertar sobre a fortaleza e suas características fundamentais quanto à moral cristã e seu aguerrido combate aos “vazios existenciais” dos falsos fortes. O tormento de Nietzche é não aceitar Deus, não conseguir substituí-LO, nem conseguir ser o seu próprio “deus’; no fundo, ele compreendia suas reduzidas ferramentas e armas para esse “combate filosófico” de moral duvidosa com um Deus que — embora afirmasse que “está morto’ — ele jamais conseguiu superar! Não foi o primeiro, nem será o último. Que seria da rosa se todos achassem que só deveria existir o carvalho. Não sei porque, mas, a figura de Golias e Davi me sobrevém à memória por atavismo, “mito pueril” ou mesmo, quem sabe, rudeza mental de um cristão afetado, segundo Nietzche.

  2. Esse merece ser condecorado todo dia sem parar. Libertador,um gigante esse mundo, não o merece.
    A cultura ocidental além de decadente é uma farsa junto xom essa igreja secular que so pregou mentira e sofrimento aos seus escravos. Mas não conseguiu comfrontar os fortes em sabedoria.

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