50 tons de socialismo feminista

Image via Wikimedia Commons
Sim, sr. Grey. TODOS os homens.

Texto originalmente publicado no site Penny Red. Tradução de Felipe Faverani.

“Ele está pronto para recebê-la agora”, diz a elegante recepcionista. Pergunto-me quanto ela deve ganhar. Algumas pessoas sentem-se desconfortáveis na presença de empregados obedientes; eu, pelo contrário, faço uma nota para falar com alguns deles mais tarde. Enquanto isso, Christian Grey, estrela bilionária mundial, espera por mim em seu escritório.

Não tenho ideia por que ele concordou em fazer essa entrevista com a Red Rag – ele deve ter mandado o pessoal dele verificar nossas inclinações políticas; sabe que nós investigamos seus registros financeiros, obscuros e confusos, tal como a própria Grey Holdings. Ninguém nunca teve certeza quanto ao que a empresa realmente faz. É preferível concentrar-se no abdome definido e nos olhos plúmbeos de Christian Grey. Mas eu não posso me interessar por alguém cujos métodos de lucrar com o trabalho alienado de só Deus sabe quantos funcionários de baixa-renda ainda precisam ser investigados.

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Eles têm um ponto positivo, no entanto – Christian Grey é incrivelmente atraente, e também muito rico e bem-sucedido, como Mark Zuckerberg – se Mark Zuckerberg fosse atraente. Como Edward Cullen de Crepúsculo, embora não o suficiente para constituir uma violação de direitos autorais, porque Grey veste terno. Só mais um sanguessuga.

“Senhorita Gold”, diz ele. Sua voz é profunda e rouca como um aspirador de pó sexy. “Por favor, sente-se. Posso chamá-la de Emma?”.

“Vamos manter as coisas num nível profissional”, eu digo, ligando o gravador.

“Você é uma garota muito doce”, ele diz: “Tenho certeza que você está apenas à espera de alguém para tirá-la desta vida mundana de jornalista iniciante. É uma indústria em colapso, você sabe. Quer saber o que faço para relaxar?” Christian Grey passa os dedos pelo espaldar da minha cadeira.

“Arrisco-me a dizer que você gosta de prender jovens mulheres submissas e de torturá-las com reclamações sobre a sua mãe”.

Christian Grey olha pela janela pensativo. “Ok, tudo bem”, diz ele, “Vamos falar sobre finanças”.

Minha deusa interior veste um colar com crânios de homens e começa a fazer uma belicosa dança da vitória.

****

Após enviar a primeira versão do meu artigo, Christian Grey aparece no meu trabalho sem aviso prévio.

“Eu não consigo parar de pensar em você, Emma”, ele diz, “Eu sinto que você realmente me vê. Como se você conhecesse partes de mim que ninguém jamais conheceu antes”.

“É porque ninguém nunca olhou detalhadamente para suas contas no exterior anteriormente”.

“Eu gostaria de levá-la para jantar comigo; mas primeiro você tem de assinar este acordo de não divulgação”.

“Eu não vou assinar nada”, digo. “Volte com uma análise detalhada de sua folha de pagamento e podemos conversar”.

Christian Grey encara-me com um olhar penetrante, como se quisesse reduzir-me a cinquenta tons de merda.

“Fique longe de mim, Emma”, diz ele, “eu sou perigoso”.

“Tudo bem”, eu respondo, “Caia fora do meu escritório, eu tenho trabalho a fazer”.

****

Já estava de volta ao meu apartamento quando o pacote chegou. Christian Grey havia-me comprado a primeira edição do meu livro favorito, “Sobre as origens da Família, da Propriedade Privada e do Estado”; uma de valor inestimável.

Cinco minutos depois, o telefone toca. É Christian. “Eu não posso aceitar presentes de uma fonte,” eu digo. “Aliás, alguma vez você já leu esse livro?”.

“Não”, ele diz, “Eu apenas pensei que, se eu lhe desse presentes caros, você pararia de perseguir-me com autorizações para liberação de informação e, como consequência, deixaria eu foder você”.

“Caramba”, eu digo: “Você precisa ir embora, sentar e pensar sobre o fetichismo da mercadoria e da remuneração do trabalho emocional. Além disso, sobre seus sérios problemas com as mulheres. A propósito, como é que você conseguiu esse número?”.

“Eu comando uma empresa de tecnologia. Rastreei todos os seus meios de comunicação. Também grampeei seu laptop”.

“Isso chama-se ciberperseguição corporativa. Eu vou enfiar uma versão do Democracy Now! na sua bunda”.

“Adoro quando você fala sacanagem, Emma”.

“Ótimo. Minha chave de segurança é “ordem de afastamento”.

***

Ok, ok, eu transei com Christian Grey. O que eu posso dizer? Eu estava entediada, com tesão e meu ar-condicionado estava quebrado. Lindo corpo, mas ele mesmo oscila entre vociferar sobre sua infância e tentar realizar suas fantasias de virjão, das quais eu gostei de nenhuma.

Quando o terno sai, Christian Grey é só mais um crianção mimado e controlador como os outros homens com quem eu já transei, exceto com mais dinheiro e um monte de caras assustadores e armados listados na sua folha de pagamento. Além disso, ele continua insistindo para que eu assine um contrato enorme e estranho com todas as coisas que ele quer fazer comigo. Entre outras coisas, eu tenho que ceder a ele o controle completo sobre os meus direitos reprodutivos. Nem por uma frota de helicópteros, meu chapa.

“Caramba”, eu digo: “Eu nunca tinha visto um contrato como este antes em toda minha vasta experiência dentro da comunidade BDSM. Isto não trata de sexo. Trata-se de controlar cada aspecto do meu comportamento. Este é o trabalho de uma pessoa perturbada com uma equipe de advogados às costas que legitima suas tendências abusivas.

Ninguém em perfeito juízo iria assinar”.

“Eu vou te comprar um Lamborghini”.

“Eu prefiro um tanque de guerra”.

***

Christian acaba cedendo e me mostra o calabouço assustador onde vive. É todo enfeitado com brinquedos sexuais bobos, cada um custando mais do que o meu apartamento. Fui a festinhas mais interessantes em Brixton.

“Meus desejos são… nada convencionais”, ele admite.

“Os meus também”, eu digo. “Eu quero derrubar o governo, eliminar o sistema monetário, instituir a automação completa e destruir o sexo masculino”.

Christian fica emburrado e decide ir para o seu helicóptero.

Quando ele volta ainda está em um estado de amuação. “Olha”, eu digo: “Eu não acho que você realmente seja “dominante” em tudo. Não sei se você compreende. Eu não quero policiar as suas fantasias, mas a forma como vocês as realiza é profundamente problemática. Você é apenas um sociopata de direita, misógino, que fica bem de terno, e que muita gente que pode achar sexy, mas eu não”.

“Você precisa aprender a gerir as minhas expectativas. Eu não sou um homem paciente”, resmunga.

Retiro meu absorvente e o jogo violentamente contra a cabeça dele.

“Tudo bem. O negócio é o seguinte”, diz Christian, limpando o sangue de seu rosto. “Eu vou lhe dar tudo o que você sempre quis, contanto que eu possa controlá-la completamente”.

“Cala a boca e me chama de Melinda Gates,” eu digo, afivelando minha cinta-peniana.

****

Minhas autorizações para liberdade de informação chegaram. E eu finalmente consegui que a recepcionista falasse, de menina para menina. Logo, logo vai haver uma grande exposição sobre as atividades da Grey Holdings. Imagino que Christian não vai ser um homem rico por muito mais tempo. Eu diria a ele, mas eu tenho que manter minhas vidas pessoal e profissional distintas.

Assim, de modo distinto:

“Fala de novo, burguês de merda!”

“A história de todas as sociedades anteriores tem sido a história da luta de classes!”

Ele fica tão gostoso quando cita Marx. “Não”, eu digo, apertando os pregadores no mamilo de Christian, enquanto sorrio. “Diga a outra coisa”.

“Seguro, são e consensual!” Ele grita.

Minha deusa interior espraia mil tentáculos e exige sacrifício de sangue.

Com agradecimentos à musa e consultora misândrica Meredith Yayanos.

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