“Zagreus, sem se mexer, parecia contemplar toda a beleza desumana da manhã de abril. Quando sentiu o cano do revólver na têmpora direita, não desviou os olhos.“ [1]
Albert Camus, escritor argelino vencedor do prêmio Nobel de literatura (em 1957), mais conhecido por sua obra “O estrangeiro”, segue na obra A Morte Feliz a sua tradição de filosofar e discutir temas inerentes à nossa natureza humana, em toda sua fragilidade e incerteza, a partir da ficção, do romance.
Funcionando como uma espécie de introdução de sua maior obra, somos apresentados a Patrice Mersault (não confundir com Meursault, protagonista de O Estrangeiro) e a sua relação com o mundo. O grande talento de Camus é conseguir tornar coisas pequenas grandiosas, e nesse sentido a relação de Patrice com Marthe e posteriormente com Zagreus e todos os personagens que surgem após a fuga de Patrice adquirem o ritmo e o lirismo característicos do autor, mostrando ao mesmo tempo técnica narrativa e observação filosófica.
Partindo do absurdo da condição humana característico à sua obra, Camus conclui que a felicidade (e, consequentemente, uma Morte Feliz) só é possível quando se é livre para usar o próprio tempo, de forma autoconsciente (o que só seria proporcionado por posses materiais como o dinheiro, tendo em consideração a realidade do nosso mundo). A pobreza seria entrave à felicidade, assim como a falta de conhecimento de si mesmo e da morte.
Dos relacionamentos de Patrice com o mundo, com as cidades por onde passa, bem como seus relacionamentos com as mulheres que passam por sua vida, tudo isso é permeado pela sensação constante de um vazio, assim como uma contemplação da situação humana em sua busca pela felicidade, qualquer que seja o preço, estabelecendo isso como o sentido último da vida: Buscar a felicidade mesmo que a morte, a cada segundo, se aproxime de nós.
Apesar de todo o aspecto sombrio, Camus não muda sua perspectiva a favor da vida. Para ele, ter medo da morte é ter medo da vida. Dessa forma, devemos buscar a liberdade até onde nos é possível. É um livro definitivo, que te coloca de frente com as chamadas verdades absolutas da vida: Contemplar o mundo em toda nossa finitude. Todos nós temos um pouco de Patrice Mersault.
“Não há grandes dores em grandes arrependimentos, nem grandes recordações.Tudo se esquece, até mesmo os grandes amores. É o que há de triste e ao mesmo tempo de exaltante na vida. Há apenas uma certa maneira de ver as coisas e ela surge de vez em quando. É por isso que, apesar de tudo, é bom ter tido um grande amor, uma paixão infeliz na vida. Isso constitui pelo menos um álibi para o desespero sem razão que se apoderam de nós.” [2]
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Referências
[1] CAMUS, Albert. A Morte Feliz. Rio de Janeiro: Record, 1997, Tradução de Valerie Rumjanek. Página 9.
[2] CAMUS, Albert. A Morte Feliz. Rio de Janeiro: Record, 1997. Tradução de Valerie Rumjanek. Página 54.