Por que não sou madura o suficiente para pensar com clareza? Laura precisa de alguém normal para juntar-se a ela. Mas, normal não seria cansativo, pacato? Já que Laura detém a manha de enxergar a beleza onde não há. “A feiura é uma beleza exótica – dizia ela”.
Muitas das vezes, ao estar em casa durante todo o fim de semana, largada em seu moletom azul ouvindo a clara evidência de Philip Glass e Wim Mertens, os seus contemporâneos favoritos, fazia algumas reflexões. Ali, lá dentro de si, quando encontrava um ponto luminoso e quente… Sentia pesar constante, sua alma frágil e delicada, característica de qualquer romancista, como que, ao olhar para fora da janela, Laura sempre visse a mesma paisagem de um dia frio e nublado. O vento seco cortava suas maçãs rosadas… Uma tímida lágrima chegava a ponto de inundar o mundo. E, mesmo assim, Laura via nuvens em formatos de ursinhos carinhosos e um homem a tocar flauta doce. Ao olhar com mais calma, não havia vozes na rua. Um dia solitário de domingo.
Como todos os seres solitários, Laura tinha a grande companhia de um gato. Deu a ele o nome de um grande filósofo, conhecido de norte a sul, leste a oeste deste mundo. O niilismo, percepção icônica desse filósofo, fazia parte de suas objeções. O que é o nada? – Ela se perguntava. Não é assim? As palavras possuem significado diferente porque cada experiência vicária é única.
O nada mais é do que o existencialismo individual. Meu mundo é nada para olhos alheios e é tudo para mim. Funciona praticamente para a maioria das pessoas, cada ser em particular têm suas nuances.
Laura parte para a cozinha a preparar um chá de coca. Repara que a flor vermelha, da qual não sabe a espécie e a chama carinhosamente de Mary Jane, posta cuidadosamente em cima da mesa da sala de estar, está cada dia mais linda, desabrocha…E Laura que pensava que Mary Jane duraria no máximo uma semana. Já se passaram três.
Notas livres circulam e harmonizam a casa. Laura também tem manias. Toda vez que vai limpar a casa, deixa exatamente os objetos em seus devidos lugares. Não lhe agrada grandes mudanças.
Retorna para o quarto com o chá e biscoitos. Feixes de raios de sol ilumina seu casulo. Enfim, ela se encontra no mundo dos livros, um romance dramático. A vida é dura. Plenamente felizes são as crianças que vivem no universo lúdico. Basta crescer e já era, a magia se perde. Tornam-se adultos de sentimentos pequenos, egoístas e medíocres. Uma pena. Uma pena…
Adorei. Há muitos anos, uma pessoa, poeta, comentando sobre Claire de Lune, disse que, sempre que ouvia a música pensava numa garotinha olhando através da janela a neve caindo lá fora, e sonhava viver… Teria sido essa pessoa quem escreveu o texto em questão? Ou Laura é personagem de algum romance?
Que bom que gostou Milton 🙂 A Laura simplesmente nasceu de uma das minhas crises existenciais. Mas um filme, leitura ou música pode dar um start, aí é só curtir a viagem. Abraço!
Meu nome é laura… Tenho todo esses sentimentos dentro do meu ser, escutei philip glass pela primeira vez em 2014 quando assistia um filme chamado The Hours, daí em diante sempre ouço, ele diz tudo sobre cada momento da minha vida… Certo dia em 2016 um amigo me mandou esse texto. Até hoje leio…
Simplesmente fantástico. Trás à memória o sentimento da alma, livre de toda concupiscência que hoje vemos escrachada em todas as postagens do mundo descartável.
Lindo demais adorei. Trás sentimentos e emoções perdidas no tempo.
😉
Adorei o conto nos traz de volta o silêncio e a proteção de nossos quartos, de nossos pequenos mundos onde realmente somos felizes.
Muito Obrigada Cesar =]