O capitalismo monopolista – Imperialismo

O presente artigo explica o nascimento do capitalismo monopolista segundo Lenin. No fim do século XIX e início do século XX, enquanto as grandes empresas conseguiram concentrar capital, tecnologias e força de trabalho, as pequenas empresas foram, paulatinamente, sendo compradas, incorporadas ou faliram. Eleva-se a socialização da produção ao máximo, mas a apropriação dos produtos ainda é privada.

Da série “Imperialismo em Lenin“.

A corrida imperialista […] buscava incentivar um orgulho quanto a atuação da nação em âmbito internacional, ou seja, as conquistas poderiam acender um orgulho nacionalista que seria utilizado como manobra de massas descontentes. Contudo, essa expansão trouxe prejuízos para as classes operárias das metrópoles imperialistas, a crescente industrialização colonial criava classes proletárias coloniais, cuja mão de obra era muito mais barata que a metropolitana, portanto, vale ressaltar que os movimentos da esquerda operária deixavam em segundo plano as discussões coloniais.

Martins, A.L.P. & Rocha, M.M.[1].

Vladimir Ilyich Ulyanov (1870 - 1924)
Vladimir Ilyich Ulyanov (1870 – 1924)

O livro O Imperialismo: Fase Superior do Capitalismo foi escrito em 1916 por Vladimir Lenin. A edição estudada para a produção do presente artigo está na revista Germinal: Marxismo e Educação em Debate, da Faculdade de Educação da Universidade Federal da Bahia e nela, o texto é reproduzido das obras completas organizadas pelo Editorial Avante!, de Portugal, em 1984.

Lenin terminou seus desenvolvimentos sobre o imperialismo no fim da Primeira Grande Guerra com análises que começaram antes mesmo de seu início. O autor observou fenômenos de acumulação de capital e concentração de produção em sua época, assim como a contradição nascente entre o monopólio e sua condição de possibilidade, o livre-comércio.

Concentração de produção e monopólios

Lenin inicia seu livro caracterizando a concentração de produção como uma característica notável do capitalismo de sua época. O autor tem dois exemplos fortes:

  1. Alemanha: que de 1882 até 1907 triplicou o número de empresas que empregavam mais de 50 operários e quase duplicou a quantidade de operários nelas empregados. Para além disso, as grandes empresas alemãs, que representavam 0,9% de todas as empresas do país, concentravam 39,4% de todos os operários do país, utilizavam 75,3% de todo cavalo-vapor e 77,2% de toda energia elétrica em quilowatts consumida.
  2. Estados Unidos da América: que em 1904, as empresas com mais de 50 operários (0,9% do total) empregavam cerca de 25,6% da mão-de-obra disponível e tinham um valor de produção correspondente a 38% da produção nacional. Dois anos depois, esses números passaram para 30,5% e 43,8% respectivamente.

Daqui se infere claramente que, ao chegar a um determinado grau do seu desenvolvimento, a concentração por si mesma, por assim dizer, conduz diretamente ao monopólio, visto que, para umas quantas dezenas de empresas gigantescas, é muito fácil chegarem a acordo entre si e, por outro lado, as dificuldades da concorrência e a tendência para o monopólio nascem precisamente das grandes proporções das empresas.[2]

Lenin considera a concentração em monopólios um dos fatores mais importantes do capitalismo no fim do século XIX e início do século XX. Entretanto, é necessário dizer que nem todos os setores de mercado são recheados de grandes empresas, principalmente com o desenvolvimento do monopólio e das estratégias de concentração de capital. Algumas empresas utilizam a estratégia da “combinação”: uma empresa internaliza partes do processo produtivo que não são diretamente relacionadas à atividade-fim e conseguem 1) garantir mais estabilidade na taxa de lucro ao longo da produção, 2) eliminar o comércio, 3) aperfeiçoar tecnicamente todas as etapas do processo produtivo e conseguir retirar lucros suplementares e 4) fortalecer a empresa combinada em relação à “simples” (que não é combinada) em períodos de crise, quando o preço da matéria-prima cai menos que o preço do produto final.

O monopólio, portanto, se expressa tanto na grande produção concentrada em fábricas destinadas à atividade-fim do negócio como no controle do processo produtivo como um todo. A livre-concorrência é superada no capitalismo monopolista, já que as empresas menores 1) não têm condições de estabilizar uma taxa de lucro ao longo do processo produtivo, 2) são obrigadas a pagar pelo lucro das empresas em etapas anteriores no processo produtivo através do comércio, 3) não conseguem taxa de lucro suficiente para implementar inovações tecnológicas como os monopólios (trustes, cartéis e grandes empresas) e 4) não conseguem superar períodos de depressão como as empresas combinadas. Esta tendência de autofagocitação das empresas capitalistas é apontada, indica Lenin, por Karl Marx desde O Capital:

Há meio século, quando Marx escreveu O Capital, a livre concorrência era, para a maior parte dos economistas, uma “lei natural”. A ciência oficial procurou aniquilar, por meio da conspiração do silêncio, a obra de Marx, que tinha demonstrado, com uma análise teórica e histórica do capitalismo, que a livre concorrência gera a concentração da produção, e que a referida concentração, num certo grau do seu desenvolvimento, conduz ao monopólio. Agora o monopólio é um facto.[3]

Tal tendência tomou corpo no início do século XX, afirma Lenin com suporte do economista alemão burguês Theodor Vogelstein. A década de 1860 foi o início da configuração dos monopólios, com forte crescimento na década seguinte, após a depressão de 1873 e a que lhe seguiu na década de 80. No período de ascenso de 1889-90, os cartéis foram utilizados como estratégia para a conjuntura então favorável e, após a crise que se seguiu, afundando os cartéis presentes, as crises capitalistas deixaram de ser consideradas como catástrofes naturais e passaram a ser momentos negativos de uma conjuntura futura favorável aos negócios. Por fim, na década de 90 os cartéis passaram a entrar em diversos setores, começando com o das matérias-primas, sendo que o ascenso do fim do século XIX e a crise de 1900-03 aconteceram sob o signo dos cartéis como organizações estabelecidas no sistema capitalista do início do século.

Assim, o resumo da história dos monopólios é o seguinte: 1) Décadas de 1860 e 1870, o grau superior, culminante, de desenvolvimento da livre concorrência. Os monopólios não constituem mais do que germes quase imperceptíveis. 2) Depois da crise de 1873, longo período de desenvolvimento dos cartéis, os quais constituem ainda apenas uma excepção, não são ainda sólidos, representando ainda um fenómeno passageiro. 3) Ascenso de fins do século XIX e crise de 1900 a 1903: os cartéis passam a ser uma das bases de toda a vida económica. O capitalismo transformou-se em imperialismo.[4]

Desta forma, a concorrência é substituída pelo monopólio e, junto a isso, há maior socialização da produção e aumento do desenvolvimento técnico. Basicamente, a livre-concorrência da etapa anterior do capitalismo, com patrões concorrendo entre si e produzindo bens de consumo para um mercado que, em seu aspecto global, era ignorado, deixou de existir para dar espaço ao planejamento máximo:

A concentração chegou a tal ponto que se pode fazer um inventário aproximado de todas as fontes de matérias-primas (por exemplo, jazigos de minérios de ferro) de um país, e ainda, como veremos, de vários países e de todo o mundo.[5]

Após este cálculo inicial, os capitalistas podem partilhar entre si a mão-de-obra qualificada e construir as melhores vias de comunicação e transporte para seus objetivos de exploração. A socialização da produção alcança seu auge e os capitalistas são levados a um regime social de transição absoluta da livre-concorrência à socialização completa, mesmo sem terem consciência ou controle deste processo. No entanto, “a produção passa a ser social, mas a apropriação continua a ser privada. Os meios sociais de produção continuam a ser propriedade privada de um reduzido número de indivíduos”[6].

No fim, mesmo que o progresso técnico e a concentração mantenha o reinado da produção mercantil, as pessoas que verdadeiramente conseguem enriquecer no mercado são as responsáveis por aquilo que Lenin chama de “maquinações financeiras”, que atuam possibilitando maior lucro para os especuladores (e não para para os produtores).

Assim, o foco de análise passa das empresas concentradoras de capital para os bancos, instituições que eram somente intermediárias de pagamentos, mas passaram a ser monopolizadoras de capital-dinheiro e conseguem, também, concentrar recursos para exercer um tipo específico de poder sobre a burguesia produtora.

Considerações finais

Com o desenvolvimento das grandes empresas capitalistas, trustes e cartéis, o livre-comércio deixou de ser o modelo do modo de produção capitalista e deu espaço para o modelo monopolista. Este modelo é o contrário da livre-concorrência entre patrões relativamente na mesma situação financeira e com as mesmas informações e inovações para desenvolver seu próprio negócio. No capitalismo monopolista, a produção das grandes empresas é melhorada através de tecnologias, novas patentes e profissionais qualificados, mas as pequenas empresas terminam por ser compradas ou incorporadas pelas maiores ou, em último caso, abrem falência.

Eleva-se a socialização da produção ao máximo, mas a apropriação dos produtos ainda é privada, desta forma, a distância entre a classe capitalista e o proletariado se mantém através da contradição entre quem produz bens de consumo e quem apropria o trabalho utilizado nesta produção.

Referências

[1] MARTINS, A.L.P. & ROCHA, M.M. Imperialismo: Paralelos Conceituais no Decorrer da História e sua Perspectiva na Atualidade. Perspectiva Geográfica-Marechal Cândido Rondon, Ed. Esp., v.11, n.15, p. 217-225, jul.-dez., 2016.

[2] LENINE, Vladimir. O Imperialismo: Fase Superior do Capitalismo. Germinal: Marxismo e Educação em Debate, Salvador, v. 4, n. 1, jun. 2012, p. 150.

[3] LENINE, Vladimir. O Imperialismo: Fase Superior do Capitalismo… p.152.

[4] LENINE, Vladimir. O Imperialismo: Fase Superior do Capitalismo… p.153.

[5] LENINE, Vladimir. O Imperialismo: Fase Superior do Capitalismo… p.154.

[6] LENINE, Vladimir. O Imperialismo: Fase Superior do Capitalismo… p.155.

4 Comentários

  1. Muito bom seu texto. A nível de sugestão, ler “Parte I” de Para Além do Capital; O novo Imperialismo; Capítulos 10 e 13 de Os Limites do Capital. Além de serem uma releitura, são ótimos para dar um plus na teoria do Imperialismo de Lênin.

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