Neste domingo (23), o senador Flávio Bolsonaro, em suas últimas atividades digitais com intuito de alavancar a campanha de Jair Bolsonaro, publicou uma imagem falsa do influenciador Casimiro Miguel segurando dois balões que formariam o número 22, supostamente indicando apoio à candidatura de seu pai. A imagem era falsa. O próprio influenciador se manifestou.
Casimiro é um dos maiores streamers brasileiros e tende a se abster de comentários políticos em seu trabalho, entretanto, após a publicação da imagem falsa, se manifestou da seguinte maneira:
Hoje, seu tweet conta com mais de um milhão de likes, recorde em toda a plataforma. Casimiro simplesmente manifestou sua indignação em utilizarem sua imagem como parte de campanha política sem qualquer menção ou autorização.
Qual é meu ponto nesta coluna? A prática rasteira bolsonarista não tem compromisso com a verdade factual, com a ética da batalha. A tática bolsonarista é o marketing exposto à crueza que lhe é peculiar: o objetivo é converter números, é gerar votos. Esses votos não podem ser contabilizados com qualquer certeza, desta forma, contar a quantidade de compartilhamentos ou likes é a maneira de contabilizar o sucesso ou fracasso da ação de marketing feita por Flávio Bolsonaro. Neste campo da mensuração digital, evidentemente a ação do senador foi um fracasso.
Logo em seguida, novamente postou uma imagem falsa, desta vez do cartunista João Montanaro:
Gostaria de expor o sentido consumista da prática política bolsonarista a partir dessas duas publicações falsas seguidas publicadas por Flávio Bolsonaro. A primeira coisa necessária é dizer: o que importa para uma estratégia de marketing é a vitória; o mais importante é atingir os números desejados. Em última instância, a estética é menos importante; a ética tem seu campo bem reduzido; qualquer tipo de elaboração que não esteja diretamente submetida ao objetivo final da ação de marketing não é importante.
O bolsonarismo lida com a conquista de votos como um departamento de marketing lida com a venda de uma garrafa plástica. É necessário vender. No caso do bolsonarismo, é necessário ganhar. A ética é suspensa, pois seu funcionamento adquire somente caráter retórico: se fala sobre ética, mas no campo minado do marketing de guerrilha bolsonarista, a ética é retirada de foco e deixa de ser a base comum para o início da batalha política. A batalha política não tem base comum, sendo assim, somente a vitória é o que interessa. Independentemente como.
Diferentemente de toda campanha política baseada em promessas ou em projetos, a campanha de marketing bolsonarista utiliza frequentemente de mentiras e fake news, com o o próprio candidato demonstrou em seus debates públicos presidenciais. Trata-se de uma campanha que não conquista eleitores, mas conquista votos. A figura do bolsonarista arrependido nunca fez tanto sentido: a condição de possibilidade do arrependimento bolsonarista é a promessa feita e realmente cumprida, mas com resultados diferentes do esperado. É possível se arrepender do voto bolsonarista porque a campanha que o conquista não contém o mesmo conteúdo da própria prática bolsonarista.
Em sua forma, claro que contém: a utilização de fake news, banco de dados para campanhas digitais, mentiras cruas. Isso tudo faz parte da campanha do candidato do PL. Mas o conteúdo próprio de cada mentira, ao ser confrontado com a realidade, não consegue se proteger. A realidade fria torna necessária a elaboração de inúmeras respostas evasivas acerca da prática política bolsonarista (como o tratamento precoce enquanto resposta à pandemia não administrada por ações de Estado que poderia ter se adiantado na compra e distribuição rápidas das vacinas).
Ao mesmo tempo, a realidade torna necessário um possível arrependimento. Este arrependimento, do ponto de vista político, talvez nem valha muita coisa. A conquista de votos a partir de ações puramente marketeiras não significa a conquista de um eleitorado (muito menos de uma militância). O ponto não é esse: a única coisa que importa é ser eleito.
O bolsonarismo coloca em jogo um tipo de prática política de campanha baseado no voto ganho, não na consciência conquistada. Voto ganho, não a simpatia conquistada. O voto que é ganho e que poderá ser arrependido logo em seguida, com a mesma velocidade que o próprio Flávio Bolsonaro publica imagens falsas em seu perfil no Instagram. O arrependimento do voto bolsonarista é rápido, pois talvez essa seja a primeira eleição democrática em que a defesa do próprio voto está subordinada a uma campanha sem qualquer objetivo de se sustentar no dia seguinte das eleições. O bolsonarista arrependido não é uma queda nas fileiras bolsonaristas: o arrependido só precisava dar seu voto, era só de seu voto que o bolsonarismo precisava. Talvez nem mesmo se vote mais.
Já sou velho, mas olho para o mundo a partir de seu ineditismo, nunca sob o ranço interminável dos anciãos.