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Introdução
O desemprego é tido como um fator estrutural do capitalismo. Tudo se passa como se nem todos fossem ter emprego, como se fosse necessário se conformar com isso. O desemprego é uma situação, também, que em nenhum momento desde a invenção do emprego propriamente dito, foi erradicada. Desta forma, qual é função do desemprego? O que acontece quando o desemprego se torna crônico?
A resposta imediata marxista é a formação de um exército reserva de mão-de-obra. Este exército reserva é a garantia de que, mesmo sob todas as flutuações do mercado e sob todas as lutas trabalhistas organizadas, nos momentos necessários haverá um punhado de trabalhadores aptos a preencher as vagas recentemente abertas, haverá trabalhadores reservas para aumentar a oferta e melhorar a eficiência da negociação do capitalista.
Mas há algo de novo na globalização. Conceitualmente, o exército reserva é um exército que pode desempenhar a função de que são reservas. São trabalhadores que, efetivamente, têm a capacidade de executar a função que o mercado lhes priva no momento do desemprego. O desemprego é, desta forma, uma situação temporária. Para os países globalizados, a garantia de que o emprego será oferecido num dado momento não é garantida. Há a situação de um emprego que não aparece, de uma recolocação que não tem possibilidade.
O capitalismo de consumo gera uma rapidez gigante na eliminação de postos de trabalho e, como consequência, aumenta a quantidade de pessoas que não estão mais no exército reserva de mão de obra. Elas não fazem parte da mão de obra possível de ser empregada.
A redundância
O fenômeno que vemos atualmente, perfeitamente cabível na análise de Zygmunt Bauman, é o da redundância. O que é o redundante? É o inútil. Por que este é um fenômeno visto atualmente? Porque atualmente temos mais trabalhadores que, ao não se adequarem à automação flexível do trabalho, se tornam obsoletos.
Estes são os trabalhadores inúteis. Desempregados não-empregáveis. De certa forma, são ex-trabalhadores. Isso ocorre a partir do momento em que estes trabalhadores não possuem mais capacidade, habilidade e eficiência para o mercado de trabalho. Não há mais ocupações a esses trabalhadores e trabalhadoras.
Quanto mais a tecnologia da informação ganha espaço, quanto menos o trabalho puramente braçal é exigido e com o aumento da exigência de mercado por padrões de qualificação (como a exigência de um idioma estrangeiro ou de um título de graduação), certos trabalhadores, como os metalúrgicos de Detroit ou operadores de máquinas na indústria automobilística, que, após a automação e a inserção da tecnologia de ponta, auto alimentada, que guarda todas informações necessárias em seu banco de dados e que pode ser monitorada e mantida por poucos técnicos, se tornam pouco úteis para o mercado.
Seu futuro está no trabalho informal, ilegal ou na mobilidade para lugares que os ofereçam trabalho. O trabalho informal é aquilo que não traz estabilidade nem possibilidade de um vida materialmente ou mentalmente confortável. Trata-se de uma ocupação de baixa remuneração considerada de segunda categoria. O destino ao trabalho ilegal é facilitado pela situação de hiperinformação e o trabalho em outros países é dificultado pelas possibilidades remotas de movimentação.
Prisão, lar dos excluídos
Qual é o lugar óbvio destes que ocupam o lugar do lixo humano, do refugo? Qual é o local do lixo na sociedade pós-moderna? A prisão. Ela é o caminho lógico para o ilegal. Mesmo se o exercício do trabalho for informal, há a possibilidade – real e presente – de não conseguir o necessário para o básico, o que leva à situação de crime, do trabalho ilegal.
A prisão é o lugar perfeito para manter esse tipo de ex-trabalhador distante da sociedade. É na prisão que, diferentemente da análise de Michel Foucault do aparelho prisional na modernidade (do panóptico), em vez de disciplinar para inserir o corpo rebelde na ordem, o mantém encarcerado para não sujar o quadro perfeito da sociedade do consumo. Afinal, se eles são inúteis na categoria do consumo, tudo se passa como se não precisassem existir.
O dilema da contemporaneidade permanece: o que fazer com o refugo? Alimentar um grupo que, apesar de não conseguir contribuir de maneira nenhuma à pungência econômica (dentro dos referenciais atuais da sociedade), tem todo o direito de ser alimentado, ou mandá-los para longe? Com certeza, nenhuma resposta é eficaz, já que o problema se encontra nos rumos do sistema atual e da globalização, não nos trabalhadores desqualificados.
Referências
BAUMAN, Zygmunt. Globalização: as conseqüências humanas. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1999.
Instagram: @viniciussiqueiract
Vinicius Siqueira de Lima é mestre e doutorando pelo PPG em Educação e Saúde na Infância e na Adolescência da UNIFESP. Pós-graduado em sociopsicologia pela Escola de Sociologia e Política de São Paulo e editor do Colunas Tortas.
Atualmente, com interesse em estudos sobre a necropolítica e Achille Mbembe.
Autor dos e-books:
Fascismo: uma introdução ao que queremos evitar;
Análise do Discurso: Conceitos Fundamentais de Michel Pêcheux;
Foucault e a Arqueologia;
Modernidade Líquida e Zygmunt Bauman.
o tal refugo também pede dinheiro, mora na rua ou vai morar com outros parentes, em periferias, favelas… enfim, é um mega dilema mesmo!
O texto num viés pessimista não dar conta de anunciar a capacidade de reação destes guetos. O grande problema desta imensa multidãp de descartaveís é exatamente a sua necessidade de ver a viabilidade do sonho do capital. As redes socias e as propagandas perderão o poder de sedução. A realidade virtual conseguirá pacificar os guetos do capital?