“Sobre a natureza humana” é fruto de um debate entre o filósofo Michel Foucault e o linguista Noam Chomsky que, à época, já tinha seu ativismo político relacionado com a desobediência civil.
O debate, promovido por um canal de televisão holandês, aconteceu em 1971 e teve como tema central a seguinte questão: há algo que se possa dizer ser inato à natureza humana?
Na busca de justificação teórica para a natureza humana, que torne o conceito não trivial, o lingüista é levado a criar uma “teoria da acessibilidade”. Uma espécie de categoria genérica, capaz de indicar por contra exemplos, ou seja, negativamente, aquilo que não podemos esperar da natureza humana. Temos, assim, uma conceituação política estruturada através de inferências negativas, o que não indica, portanto, um “sistema” acabado. Surge-nos então uma pergunta: a não sistematicidade do conceito de natureza humana é decorrência de sua constituição enquanto tal ou apenas uma condição temporária da investigação em progresso? Chomsky, ao nosso ver, não poderia jamais arriscar um relativismo absoluto para a natureza humana, mesmo em sua articulação meramente “acessível”, o conceito de natureza humana possui algo de inegociável; seu ponto de partida é anti-histórico, pois, em seu conjunto, a epistemologia de Chomsky é de base essencialista, com mais precisão, temos neste um adepto incorrigível da lingüística cartesiana em todas as suas conseqüências, quer sejam elas funestas ou não.[1]
Já Michel Foucault intervém salientando a necessidade de descobrir relações de poder aparentemente inexistentes ou inocentes:
Quando Elders direciona o debate para política, Foucault aponta não uma agenda bem definida como o anarcossindicalismo de Chomsky, mas a tarefa urgente de desmascararmos o poder manifesto nos mais recônditos, inusitados e cotidianos espaços e situações. E aqui, ao menos até esse debate, é o momento que Foucault mais se aproxima de uma concepção de criatividade, que é a parresia: a coragem de falar com franqueza, mesmo em situações de risco. Isso pode levar à cicuta, como Sócrates, ou à mudança de paradigmas como Foucault.[2]
O vídeo está disponível por inteiro e com legendas em português. Aproveite!
Referência
[1] REIS, Leonardo. Natureza humana e política: o ponto de vista chomskiano. Kínesis, Vol. I, n° 02, Outubro-2009, p. 309 – 326.
[2] BITTENCOURT, Vinicius. O debate entre Noam Chomsky e Michel Foucault. UNICAMP.
Instagram: @viniciussiqueiract
Vinicius Siqueira de Lima é mestre e doutorando pelo PPG em Educação e Saúde na Infância e na Adolescência da UNIFESP. Pós-graduado em sociopsicologia pela Escola de Sociologia e Política de São Paulo e editor do Colunas Tortas.
Atualmente, com interesse em estudos sobre a necropolítica e Achille Mbembe.
Autor dos e-books:
Fascismo: uma introdução ao que queremos evitar;
Análise do Discurso: Conceitos Fundamentais de Michel Pêcheux;
Foucault e a Arqueologia;
Modernidade Líquida e Zygmunt Bauman.
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