No mundo atual, ser de esquerda é como estar em uma máquina de pinball. A bolinha vai quicar em todos os lados, você vai se esforçar pra fazer ela subir, você vai se matar pra não deixar que ela caia no buraco, entretanto, não adianta todo o seu esforço, o fim do jogo se dá quando a bolinha alcança o buraco e você perde a jogada. No pinball, o jogo acaba quando você perde, justamente porque a mesa já está inclinada para o buraco – o jogo é feito para que só acabe quando o jogador perder. As informações são do Jacobin Magazine.
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Provavelmente, esta é a primeira vez na história que podemos de fato dizer que o capitalismo é global. Ele circula e se impõe sem nenhum impedimento (a URSS, goste ou não, fazia seu trabalho de contraposição forte, mas agora, nada pode barrar a dominação do capital) e suas regras coagem todos os Estados, impedem que as demarcações dos Estados-nação tenham alguma validade prática. Todos estão à mercê do capital e é exatamente nisso que a metáfora do pinball se mostra correta.
Não importa o esforço dos movimentos sociais como o feminismo, as lutas dos sem-terra, as lutas por reforma política, por uma democracia mais participativa, lutas por mobilidade urbana e lutas dos trabalhadores, no fim, ainda vemos a velha desigualdade ainda permanecer firme e forte, como a bolinha que cai no buraco.
As dificuldades enfrentadas pelos movimentos sociais, como o baixo engajamento na pós-modernidade, a imagem gasta do comunismo e a necessidade de criar novos projetos utópicos, precisam ser combatidas em uma conjuntura de capitalismo global sem oposição forte. O capitalismo se transformou em um a priori que todos precisam aceitar goela abaixo.
Não é complicado de entender essas dificuldades: a quebra da URSS e a própria experiência trágica do socialismo no século XX foram como bombas para os objetivos revolucionários da esquerda e dos movimentos sociais. Segundo matéria no Jacobin Magazine, a crença em grandes projetos para a transformação do mundo foram abandonadas após estes episódios. Mais do que isso, a própria noção de que as mudanças sairiam dos trabalhadores foi substituída pelo livre-mercado e pela noção funcionalista corporativa: ou seja, o trabalhador e o empregador precisariam de ajudar, cooperar, deveriam se complementar.
Para se opor a toda máquina política utilizada pelos movimentos do século XX, os seus sucessores da pós-modernidade apelam para uma estrutura flexível, sem líderes e sem a necessidade de hierarquias. O Occupy é o maior exemplo, cita a revista, já que preservam um senso de democracia radical e libertária.
No entanto, este não pode ser o modelo de resistência ao capitalismo global. Quando os movimentos abdicaram da hierarquia em busca de uma tática perfeita, ou seja, retiraram a centralidade da organização para a uma primazia da tática, que qualquer um poderia exercer, também se retirou a necessidade do engajamento rígido. Dessa forma, não é necessário “ser um black bloc“, porque Black Bloc é só uma tática, portanto, o indivíduo só precisa fazer parte da tática, utilizando os mesmo adereços e as mesmas práticas.
O problema é que uma prática precisa significar algo para quem pratica. O ponto forte da militância de organizações rígidas é a formação de base e a exclusividade (neste ponto, a exclusividade precisa ser entendida como a necessidade de, para fazer parte dessas organizações, ser formado por elas). Desta forma, não há como alguém fora dos objetivos da organização militar por ela. Diferente das táticas, que podem ser exercidas por qualquer um.
Essa ligação do militante com a causa é importante, pois uma organização costuma ter um fim, já uma tática é somente um meio. É por isso que ela não pode combater por muito tempo o capitalismo global. É necessário ter um fim em comum, um bom projeto utópico.
Desta forma, fica claro que um partido de massas aos moldes clássicos já não funciona, mas muito menos a tática flexível e horizontal. É necessário, então, criar uma forma de ação que seja forte e ao mesmo tempo compreensiva à contemporaneidade. Para a Jacobin Magazine, é necessário mais do que dizer qual é o problema, mas dizer quem pode resolvê-lo.
É hora de entender que o trabalho de revistas independentes, sites de notícias e grupos de estudos são importantíssimo para a formação de uma nova maneira de pensar o mundo. Esta nova maneira de pensar o mundo precisa tomar a responsabilidade de inventar uma nova forma de lutar, de entrar no espaço político com força mesmo em um espaço de tão pouco engajamento.
Instagram: @viniciussiqueiract
Vinicius Siqueira de Lima é mestre e doutorando pelo PPG em Educação e Saúde na Infância e na Adolescência da UNIFESP. Pós-graduado em sociopsicologia pela Escola de Sociologia e Política de São Paulo e editor do Colunas Tortas.
Atualmente, com interesse em estudos sobre a necropolítica e Achille Mbembe.
Autor dos e-books:
Fascismo: uma introdução ao que queremos evitar;
Análise do Discurso: Conceitos Fundamentais de Michel Pêcheux;
Foucault e a Arqueologia;
Modernidade Líquida e Zygmunt Bauman.
E aí, Vinícius? Jogou a bola pra gente? Responsabilidade!
Hein?
“É hora de entender que o trabalho de revistas independentes, sites de notícias e grupos de estudos são importantíssimo para a formação de uma nova maneira de pensar o mundo. Esta nova maneira de pensar o mundo precisa tomar a responsabilidade de inventar uma nova forma de lutar, de entrar no espaço político com força mesmo em um espaço de tão pouco engajamento.”
😛 É um trabalho em conjunto.