Grupo “Revolucionários Negros de Londres” destrói artefato anti-mendigo de loja

Na Inglaterra, um grupo intitulado "Revolucionários Negros de Londres" realizam ações diretas contra as políticas conservadores de austeridade, depredando os artefatos "anti-mendigos" colocados por rede de lojas.

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Membros da organização preencheram os espetos “anti-mendigo” com cimento, em rede e supermercados no centro de Londres. Foto: Tom Johnson

London Black Revolutionaries (LBR), ou “Revolucionários Negros de Londres”, é o nome da organização que preencheu com cimento os “espetos anti-mendigo” colocados por uma unidade da rede de supermercados Tesco, em Londres. A ação aconteceu na madrugada do dia 12 e fez parte da guerra contra os novos instrumentos da arquitetura urbana: os artefatos que procuram afastar os excluídos (como os moradores de rua) da cidade. As informações são da VICE.

O número de sem-tetos na Inglaterra aumentou em 13% em 2013, segundo o jornal The Guardian, e tem como causa o aumento dos preços no mercado imobiliário e os cortes cada vez maiores de benefícios e serviços públicos. O resultado destas medidas de austeridade aplicadas pelo Partido Conservador, do primeiro-ministro David Cameron, é o aumento de moradores de rua que procuram locais protegidos para passarem a noite.

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“Esses espetos estavam em um lugar onde as pessoas procuravam por algum aconchego, um lugar menos molhado para encostar a cabeça”, conta membro da organização. Foto: Tom Johnson

Bauman explica em Medo Líquido que a cidade passa a ser o espaço de encontro entre incluídos e excluídos, se transformando em um local mixofílico (que busca a diferença) e ao mesmo tempo mixofóbico (que tenta afastá-las) e o componente de exclusão é visto na arquitetura urbana e na aplicação de artefatos anti-mendigos. Os espetos são a forma de manter os excluídos longe dos espaços que não são deles.

“Esses espetos estavam em um lugar onde as pessoas procuravam por algum aconchego, um lugar menos molhado para encostar a cabeça. São lugares em que as pessoas mais vulneráveis se deitam. Nós damos nosso dinheiro ao Tesco e é assim que eles nos tratam”, conta um dos ativistas à VICE, que estava com luvas grossas, já sujas de cimento e cal, logo após tentarem espalhar com pedaços de madeira todo o cimento sobre os espetos de ferro. “Tomamos uma ação direta porque queríamos ligar a objeção política aos espetos anti-mendigo a uma mensagem real, pressionando para que eles fossem removidos”, explica a organização em entrevista.

Apesar de, a primeiro momento, enfrentarem dificuldades para espalhar toda a mistura sobre os artefatos de ferro, o resultado final foi aprovado pelo grupo, “queríamos fazer uma bagunça que eles tivessem que limpar depois, para que eles pensassem seriamente antes de colocar espetos novamente. Recebemos dicas de alguns pedreiros que estavam vendo tudo do outro lado da rua. Da próxima vez, nosso trabalho com concreto vai ficar muito melhor”, contam.

Ao serem interpelados sobre a possibilidade de enquadrarem seus atos como vandalismo (e crime), respondem prontamente, “nós não ligamos, pra ser honesto. Se outros espetos aparecerem por aí, nós vamos fazer a mesma coisa”.

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“Tomamos uma ação direta porque queríamos ligar a objeção política aos espetos anti-mendigo a uma mensagem real, pressionando para que eles fossem removidos”, explica a organização em entrevista. Foto: Tom Johnson

A organização

Os Revolucionários Negros de Londres são uma organização pequena (com pouco menos de 20 integrantes), composta por socialistas negros e asiáticos e pautada em princípios antirracistas, antifascistas, anti-homofóbicos e antissexistas, e olham com desconfiança a militância das outras organizações locais. “Muitas dessas organizações, apesar de serem da classe trabalhadora, têm aspirações e ansiedades de classe média, o que faz com que elas percam qualquer conexão real com a classe trabalhadora comum”, contam.

Segundo seus integrantes, apesar de pequenos, estão em franco crescimento, “somos organizados em ramos locais. No momento, somos três. Isso está crescendo rápido e logo podemos ter alguns ramos no norte, o que vai pôr em questão o nome “Revolucionários Negros de Londres”, explicam.

Eles atuam na luta contra o racismo institucional, a brutalidade policial e fazem parte de resistências anti-despejos. Eles perceberam que nas revoltas estudantis de 2010, acorreu algo similar às manifestações de junho de 2013, no Brasil: a maior parte dos militantes era composta por estudantes, que voltaram à apatia com o fim das revoltas. Para tentar reavivar o espírito de luta nestas pessoas, o grupo pretende realizar visitas em escolas técnicas da região e montar um site de torrents com cursos gratuitos para a auto-formação dos jovens.

“queríamos fazer uma bagunça que eles tivessem que limpar depois, para que eles pensassem seriamente antes de colocar espetos novamente”, diz ativista. Foto: Tom Johnson

Em fevereiro, a organização interceptou um grupo de fascistas húngaros no centro de Londres, “mostramos a eles o que acontece quando os fascistas vêm para Londres”. Segundo o LBR, a intenção é realizar protestos, mas ir além, “não queremos apenas fetichizar protestos quando não há nenhum impacto. Queremos enfrentar os fascistas. Até 2015, queremos que Londres tenha uma reputação de zona livre de fascismo”.

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Os espetos foram cobertos com cimento, resultando em uma enorme sujeira. Foto: Tom Johnson

 Negros e asiáticos

Como a organização é fechada, não sendo permitida a entrada de pessoas fora da descrição preliminar (socialistas negros asiáticos), pode-se pensar que eles estão reproduzindo a mesma exclusão que sofrem, mas eles dizem que esta é a única forma de conseguir poder político. “Estamos nos organizando sobre questões em particular, como racismo institucional, que nossos colegas brancos da classe trabalhadora não enfrentam da mesma maneira. Mas damos valor aos nossos aliados políticos. Não quero pensar que estamos isolando outras pessoas. Começamos uma base para criar nosso grupo. Não podemos querer falar por pessoas que estão fora de nossa experiência racial e social. Talvez, quando formos maiores, possamos ser uma organização da classe trabalhadora mais ampla como militantes – estamos abertos a todas as possibilidades”, dizem.

E ainda complementam, “vivemos num país de maioria branca, então a maioria das organizações políticas também é branca. Não que isso seja um problema, mas acaba significando a falta de um ângulo específico ou experiência dentro dessas organizações. Essa pode ser uma experiência muito isolada”.

Apesar de pequenos, o grupo age e tem objetivos de uma grande organização. São ativos em suas causas principais e prometem continuar a agir:

“Estamos preparados para fazer o que for preciso. A maioria de nós não tem nada a perder”.

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Fachada da loja com instrumentos “anti-mendigos”. Foto: Tom Johnson

 

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