O que é dialética? – Vladimir Safatle

A dialética é uma força de transformação que busca dar corpo, existência, ao que é considerado impossível. Mostrar como o impossível é uma versão não configurada na realidade presente, mas não é um inexistente.

Programa “Diálogos”, exibido pela Globo News em 20 de junho de 2019.

Mario Sergio Conti entrevista o filósofo e psicanalista Vladimir Safatle, professor do Departamento de Filosofia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo.

Safatle está lançando “Dar Corpo ao Impossível”, livro sobre a dialética e as ideias do filósofo alemão Theodor Adorno.

Filósofo Vladimir Safatle

Vladimir Safatle – A dialética é um dos termos técnicos mais antigos da filosofia, foi um dos primeiros. Indicava um processo muito vinculado ao diálogo no qual você utilizava os pressupostos do seu oponente o fazendo entrar em contradição com seus próprios pressupostos.

Por isso que depois, na idade média, a dialético se transformou em um elemento da arte da retórica. Até o século XIX, quando ela ganha uma outra configuração, ela vira uma dimensão fundamental de uma noção de filosofia ligada a uma potência de crítica e no interior dessa crítica dialética, o exercício fundamental é insistir em como contradições que aparecem na vida social quanto aparecem também na estrutura do pensamento não são indicações de impossibilidades, de pontos onde não é possível mais pensar (como normalmente se pensa, onde há uma contradição há algo em que não se pode pensar).

A dialética insistia, na verdade, que essas contradições simplesmente indicavam processos que dentro da nossa situação, tal como nós a organizamos, tal como nós a pensamento, são impensáveis, mas esse impensável não é um inexistente (por isso essa ideia de impossível, esse impossível não é o inexistente, ele é a possibilidade de algo que até agora não se configurou). A dialética tentava, a sua maneira, ser fiel a esta ideia, de que aquilo que é impossível, torna-se possível.

Mario Sergio Conti – Hegel, Adorno, como você vê isso. Você chegou ao conceito de dialética negativa, que é do adorno, o que é isso?

Vladimir Safatle – Os conceitos filosófico são conceitos em situações históricas. A dialética teve três grandes versões e cada uma dessas versões (Hegel, Marx, Adorno) diz respeito a um certo momento histórico. Ela indica coisas que podem ser feitas naquele momento histórico e como fazê-las.

A última versão, a dialética negativa,  parte do seguinte pressuposto: o modo de organização da nossa situação atual, da nossa linguagem, da nossa forma de pensar, está tão bloqueado que é necessário utilizada uma força de negação para que aquilo que possa um dia ser diferente, apareça.

Há certas situações em que se você afirmar algo, você anula a sua força de existência, então você precisa retirá-la da situação, como uma estratégia de guardar um tipo de existência que agora, neste momento, não pode se configurar. As pessoas viam isso como um niilismo, mas era uma falta de compreensão de uma estratégia filosófica muito importante e muito utilizada: em certas situações não dizer algo é a única maneira de preservá-lo.

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