Relações entre saber e poder em Foucault – DROPS #55

Saber e poder em Michel Foucault. Canal do Colunas Tortas. Disponível em <<https://youtube.com/live/6pZhbpzlVXk>>. Acesso em 22 de outubro de 2023.

A primeira coisa relevante é compreender que saber e poder constituem dois níveis teóricos para se compreender a organização das coisas na vida real. Falar sobre saber e poder é uma maneira de compreender como os conhecimentos emergem e se organizam, como as concepções acercada sociedade, as práticas políticas e etc, emergem e se tornam realidade. É construir uma base para entender as áreas de conhecimento analisadas.

É comum, a partir da teoria marxista e a partir de algumas teorias liberais, que a estrutura econômica é um determinante social. Michel Foucault não nega essa realidade, mas compreende que só é determinante social porque as relações entre saber e poder inserem a estrutura econômica num lugar privilegiado. Ou seja, a nossa realidade é configurada de tal maneira que a estrutura econômica, as relações econômicas, tendem a ser mais importantes para definir as outras relações e esferas da vida social.


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Dito isso, fica claro este primeiro ponto: saber e poder fazem parte de um nível anterior ao nível das ciências, anterior ao conhecimento. O conhecimento é produto do saber que é legitimado por um método e reconhecido como conhecimento. Saber é esse “sistema”, essa “estrutura” de enunciados, de regras de enunciados, e dentro dos saberes há a possibilidade de partes mais formalizadas, partes mais coesas, emergirem a partir de regras específicas e tornarem-se discursos. O saber é este alçapão de temas parecidos, correlacionados que pode fazer emergir ou não um discurso. O saber da realidade social pode ou não ter um discurso científico, o saber médico pode ou não ter um discurso médico. O trabalho de Foucault demonstra o nascimento de um discurso específico da medicina clínica e da loucura que nascem de um saber médico (e tem relações com outros saberes).

O poder, por sua vez, está no nível das relações de força. Como algo relacional, que se fundamenta nas relações de força, ou seja, na relação de força contra força. O poder situa-se, assim, na abordagem teórica, fora do campo discursivo. Não necessariamente passa pelo discurso. No entanto, na realidade concreta, saber e poder estão sempre em conjunto, separá-los é uma maneira teórica de lidar com objetos de análise, mas a realidade os manifesta concomitantemente.

Por exemplo, numa sala de aula, numa escola com pedagogia tradicional, o que se tem é um professor suposto detentor do saber e alunos que supostamente estariam ali para receber o conhecimento do professor. De início, já se compreende uma relação de poder colocada em jogo, uma hierarquia em que o professor é aquele que sabe e o aluno é aquele que não sabe. Para além: o professor é aquele que sabe e está lá para ensinar, logo, o aluno é aquele que não sabe e está na situação para aprender. O professor fala, o aluno escuta.

“Saber e poder em Michel Foucault”. Veja aqui:

Nesta relação hierárquica fica claro o exercício do poder que, pelas vias institucionais, é exercido pelo professor sobre os alunos, pela escola sobre os alunos e pela instituição sobre o professor, que o designa como responsável por exercer poder sobre os alunos. Mas há também relações discursivas que transforma o aluno como um sujeito que deve respeito imaculado ao professor. Que transforma o professor a alguém que deve um respeito disciplinar aos alunos. Há também relações discursivas que fundamentam a hierarquia entre professor e aluno, o inserindo na situação o professor como um adulto e o aluno como uma criança. Desta maneira, transformando a insatisfação do aluno em rebeldia infantil e a insatisfação do professor perante o aluno como a insatisfação de um disciplinador perante uma criança rebelde.

Esta dinâmica, tanto discursiva como de poder, preenche a relação hierárquica entre professor e aluno, a faz existir, e estigmatiza o aluno como alguém que não sabe nada. A sala de aula em fileira também contribui a isso: ela é perfeita à vigilância e à prática de ensino do professor. Ela não é perfeita para uma prática pedagógica de igual para igual, com alunos e professor se olhando olho no olho. Ela é perfeita para uma pedagogia que deposita conteúdos nos alunos, supostos sujeitos vazios de conteúdo.

O grande ponto é que o aluno absorva o conteúdo ou a relação. A depender da classe social, basta apreender o conteúdo e passar no vestibular. Mas também, a depender da classe social, o conteúdo nem importa, o que importa é incorporar a hierarquia e ser um corpo disciplinado, ser um bom funcionário quando estiver fora da instituição escolar.

 – Vinicius Siqueira.

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