A população emerge como novo personagem político da modernidade. Ela é caracterizada como resultante de diversas variáveis: climáticas, urbanas, econômicas, psicológicas, culturais, tributárias, etc. Não se trata mais de ter na população a expressão da força de um soberano: a população, na modernidade, é o fluxo de desejo que pode ocupar o espaço público. Entende-se, assim, que a nova forma de governo trabalha para confluir os desígnios do poder e a vontade geral da população captada através de uma certa liberalização com objetivo de tornar livre o movimento dos desejos de cada indivíduo.
Autor: Vinicius Siqueira
A arte de governar: lidar com o acontecimento no biopoder – Michel Foucault
Uma das responsabilidades do capitalismo mercantilista nascente é lidar com o acontecimento com alguma segurança: é necessário resolver problemas que flagelaram a Europa durante séculos, sendo a escassez alimentar um deles. Para isso, os dispositivos de segurança são construídos, criados, elaborados de tal maneira que sua ação supere as limitações juridico-disciplinares (portanto, não deve se comportar como lei para intermediar) e se mantenha numa zona de liberdade, de liberalização. Tomando ainda a escassez alimentar como exemplo, o ponto central da elaboração biopolítica não é a resolução completa do problema para que a fome se extinga, mas sim a dispersão da fome, a dissociação da fome como flagelo social, transformada em problema de um indivíduo ou outro, mas não da população.
A normação e a normalização – Michel Foucault
Entende-se que o biopoder cria normas através de um processo inverso ao do poder disciplinar: a norma não é uma medida ideal, quase uma meta e que estabelece uma normação; ela é de fato o normal estatístico, frequente, recorrente, que pode ser medido e comparado, que gera a normalização. Assim, tem-se um tipo de poder que consegue lidar com a norma como caminho para se chegar ao normal estatístico, mas não tem preocupação em garantir solução plena para seus problemas. Alcançar o normal é a estratégia inicial, que se desdobra para todas as segmentações possíveis.
O espaço, a cidade e o meio no biopoder – Michel Foucault
A cidade da soberania é pensada como centro moral, estético e econômico do Estado. A cidade disciplinar distribui de maneira aprimorada cada espaço disponível a partir de um tipo específico de simetria. A cidade da segurança é previsível, ao mesmo tempo, trabalha para manter todo espaço de aleatoriedade dentro de um campo de controle. Nasce uma cidade pensada nos efeitos à população de cada decisão política de planejamento e distribuição espacial.
A sociedade de segurança – Michel Foucault
A sociedade de segurança é aquela, assim, cuja economia própria do poder tenha uma forma tal que possa ser denominada de segurança, majoritariamente com a franca prática dos dispositivos de segurança.
O homem-bomba – Achille Mbembe
O território ocupado e regido pelo necropoder gera dois tipos de lógicas próprias para aquelas que são suas vítimas: a lógica da sobrevivência e a lógica do martírio. Enquanto a primeira é amparada pela noção de morte do outro como possibilidade da sobrevivência do eu, a segunda insere o sacrifício como elemento de libertação e transgressão, tendo no homem-bomba sua ilustração perfeita.
Necropoder e colônia – Achille Mbembe
A partir de Mbembe, entende-se que a colônia tardo-moderna é o laboratório de observação do exercício do necropoder. No território ocupado, tem-se a categorização de tipos de pessoas, sempre num status entre sujeito e objeto, de tal maneira que a própria humanidade deve ser vista em perspectiva. O racismo de Estado, enquanto necessidade para fazer morrer na tecnologia do biopoder, carrega consigo o fortalecimento da raça que se deve fazer viver; o necropoder não funda a morte na contrapartida da vida necessária, o necropoder age pela morte como necessidade civilizacional, como ação por si, classificação e proposta de morte.
Necropolítica e biopoder – Achille Mbembe
O biopoder, através do racismo de Estado, cria ferramentas de anonimato na morte em massa daqueles que podem e devem ter seu direito de viver atravessado pelo fazer morrer do poder. Quando se observa as colônias, percebe-se que a guerra é amparada pelas fantasias geradas colonialmente e seu objetivo não é a paz. A guerra já não funciona nos moldes da leitura política tradicional, como enfrentamento de Estados soberanos, como enfrentamento submetido a regras que indicam a civilidade dos participantes. Assim, o massacre colonial é liberado. Tem-se, então, a necropolítica operada.
Política para morte – Achille Mbembe
Neste início de argumentação, Achille Mbembe busca uma maneira fora da tradição tardo-moderna de leitura política para compreender a possibilidade da criação de máquinas de morte no exercício do poder pelos Estados modernos. Este exercício não poderia ser explicado sob os auspícios da leitura política vigente guiada pela razão e pela comunicação, mas sim por uma análise das possibilidades de construção de mecanismos de poder em que a morte é protagonista (e isso justamente nos Estados que encabeçam as luzes). É necessário uma análise da soberania enquanto elemento de transgressão, não de iluminação.
O gesto de leitura político – Michel Pêcheux
O gesto de leitura é o atravessamento do sujeito pelo discurso expresso na forma da escritura a respeito de outros textos, outros discursos. Neste trabalho, os discursos de Ciro Gomes, Fernando Haddad e Marina Silva são analisados para se compreender o gesto específico de suas leituras a respeito da reunião ministerial do Governo Bolsonaro ocorrida no dia 22 de abril de 2020. Os resultados são os esquemas semânticos de cada candidato para dar vazão aos seus olhares próprios a respeito do acontecimento.